O tema "Economia Verde" está emergindo com cada vez maior visibilidade, e será um dos grandes focos do debate daqui para a frente. É uma expressão instigante, mas nova e imprecisa, que ainda dá margem a muitas dúvidas. Atenta a este fato, a Green Economy Coalition - GEC (
www.greeneconomycoalition.org, em inglês) está realizando em vários países do mundo uma série de "Diálogos Nacionais", visando dar mais clareza ao tema, e a focar o modo como este será tratado em maio de 2012, na Conferência da ONU sobre Desenvolvimento Sustentável, no Rio de Janeiro. Como membro da GEC e colaborando nesse processo, o Vitae Civilis - em parceria com o PNUMA e o IEED (Londres) e com o apoio de um várias entidades e empresas de alta relevância nacional e global - realizará nos
dias 11 e 12 de Novembro, em São Paulo, o
seminário "Diálogos Nacionais - Rumo à Rio+20". Será uma reunião de 120 especialistas, com o objetivo de mapear as discussões do tema no Brasil e lançar bases para evolução do debate em 2011 e 2012.
www.greeneconomy.org.br.
Há fortes indicações de que a expressão “green economy” - “economia verde”, na tradução literal – se tornará cada vez mais comum, tanto no discurso específico relacionado às questões da sustentabilidade, quanto na comunicação em geral. “Verde”, no entanto, é um adjetivo por demais impreciso e flexível para qualificar algo tão complexo e rico quanto o que se vislumbra como a expressão material peculiar da nova fase em que, se tudo der certo, entrará nossa civilização.
Verde, a princípio, é apenas uma cor, e evidentemente não se aplica à Economia. Mas pode também pode ser o contrário de “maduro” (quem sabe, até maduro demais, em vias de apodrecer). Nesse sentido, poderia ser mesmo o contrário da economia atual, que claramente já dá mostras de estar passando do ponto. Verde ainda pode ser – por extensão de sua aplicação a partidos e movimentos sociais - a qualificação do que é “ecológico”, “amigo do meio ambiente”, “sustentável”. É neste último sentido – ainda impreciso – que o “verde” colou-se à Economia.
É surpreendente que um documento oficial da ONU (a resolução 64/236 da Assembléia Geral, que convoca a Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável - também conhecida como Rio 2012 ou Rio+20) diga, literalmente que “O foco da Conferência incluirá os seguintes temas, a serem discutidos e refinados durante o processo preparatório: uma economia verde no contexto do desenvolvimento sustentável e de erradicação da pobreza, e o quadro referencial institucional para o desenvolvimento sustentável¹”. Diga-se, porém, em favor do uso do termo naquele documento, que a expressão já vinha sendo utilizada há bastante tempo, em publicações de várias origens e mesmo no âmbito da própria ONU.
A despeito desse uso cada vez mais corrente do termo, a imprecisão continua, com o risco de gerar confusão tanto maior, quanto mais de dissemine o seu uso. Ao realizar seus Diálogos Nacionais, a Green Economy Coalition² busca dar mais clareza ao conceito e, ao mesmo tempo, mobilizar os atores relevantes, articulando-os e identificando prioridades, oportunidades e desafios para acelerar a penetração desse novo paradigma nos fluxos dominantes da economia. Incidir nas políticas públicas de cada país e nos resultados da Rio+20 são também objetivos dessa iniciativa.
Outro ponto de alerta é a confusão entre “economia verde”, “desenvolvimento sustentável” e “sustentabilidade”. Evidentemente estes três conceitos são relacionados, mas não devem ser utilizados indiscriminadamente, nem intercambiados como se fossem equivalentes. A discussão sobre isto poderia tomar várias páginas, mas aqui deixaremos apenas registrado, sinteticamente, que o desenvolvimento sustentável pode ser visto como a macro-estratégia de nossa civilização, visando sua sustentabilidade num ambiente próximo ao natural. “Economia verde”, aqui, surge como o conjunto de mecanismos econômicos (ou a eles relacionados) por meio dos quais se deseja colocar urgentemente em marcha a instalação desse novo modelo civilizatório.
Pessoas, Planeta e Prosperidade - Como ponto central de nosso posicionamento, enfatizamos que a “economia verde” não pode limitar-se ao lado ambiental: é preciso também que sejam levados em conta os aspectos sociais e econômicos, junto com o bem estar e o potencial de realização pessoal de cada indivíduo. Por isso, preferiríamos traduzir green economy como “economia verde e inclusiva”.
Aparentemente as considerações acima são consensuais: são raras propostas que assumidamente enfoquem a “economia verde” como algo que vise exclusiva ou prioritariamente o aspecto ambiental, em detrimento de todos os demais. Assim, um bom ponto de partida parece ser a definição de “economia verde” próxima à proposta da Green Economy Initiative, do UNEP:
“É a Economia que resulta em melhoria do bem-estar humano e equidade social, ao mesmo tempo em que reduz significativamente os riscos ambientais e a demanda sobre recursos escassos do ecossistema. Uma ‘green economy’ é caracterizada por um crescimento substancial nos investimentos em setores econômicos que, visando tais resultados, aproveitam e potencializam o capital natural do planeta.”
Mas, se esta definição geral parece ser amplamente aceita, o mesmo não ocorre quando se trata da sua aplicação prática. Ao se enfocar situações concretas – como a definição de políticas econômicas e o estabelecimento ou direcionamento de negócios reais – surgem conflitos de várias naturezas: pode ser chamada de “verde” uma tecnologia que é menos emissora de gases de efeito estufa, mas que põe em risco a biodiversidade? Ou um sistema que, ao viabilizar a incorporação de variáveis ambientais como fatores de custo, abre também novas possibilidades de especulação, de privatização de ativos naturais ou de concentração de renda e poder? Ou, ainda, ganhos de produtividade que, ao mesmo tempo em que geram uso mais eficiente dos recursos naturais, também levam ao fechamento de postos de trabalho?
Isso sem falar na questão do crescimento, evidenciada em alguns poderosos discursos que substituem green economy por green growth, como se “economia verde” e “crescimento verde” fossem sinônimos. Não se trata de simples terminologia, mas de uma fundamental diferença quanto ao próprio foco e razão de ser da atividade econômica: é mesmo preciso – como até hoje se faz - buscar sempre o crescimento econômico (ignorando o fato de que é fisicamente impossível algo crescer indefinidamente num ambiente finito), ou devemos começar a pensar seriamente na prosperidade sem crescimento, ou seja, na maximização dos benefícios daquilo que já se dispõe, por meio de maior produtividade e melhor uso e/ou distribuição dos recursos?
A constatação das polêmicas acima coloca em evidência pelo menos dois pontos fundamentais: um, que as condições “verde”/“não verde” não podem ser vistas binariamente e, outro, que para se orientar uma ação coordenada (ou pelo menos alinhada) rumo à “economia verde”, será necessário ir além da definição consensual genérica, construindo-se definições mais tangíveis, que sejam operacionais, sem perder a consistência com a definição geral. Produzir diretrizes e construir caminhos para o consenso em relação a pelo menos esses dois pontos é o propósito dos Diálogos Nacionais, promovidos pela Green Economy Coalition e seus parceiros.
Leia o texto completo na seção artigos em destaque em
www.vitaecivilis.org.br¹Tradução do autor, de trecho do documento “United Nations – A/RES/64/236, de 24/12/2009, parágrafo 20(a), p.5).
²Rede formada em 2009 com o objetivo de acelerar a transição para a green economy e, ao mesmo tempo, garantir que esta seja entendida em sua plenitude. Visite:
www.greeeneconomycoalition.org